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Sexta-feira, 03 de maio de 2024

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Lançamento

Irmão do poeta Manoel de Barros lança livro com histórias da família, crônicas e ensaios

Foto: Reprodução

Abílio Leite de Barros, irmão mais novo do poeta Manoel de Barros

Abílio Leite de Barros, irmão mais novo do poeta Manoel de Barros

Reflexões sobre a infância, sobre o desenrolar de sua história, lembranças do irmão Manoel de Barros e sobre os pais, ensaios sobre política e filosofia, crônicas “quixotescas de um ingênuo salvador da pátria” e outra porção de textos compõem o livro “Recoluta”, de Abílio Leite de Barros, irmão doze anos mais novo do aclamado poeta Manoel de Barros.

Lançado nesta quinta-feira (24) pela editora Letra Livre, o nome da publicação já diz muito sobre si. Logo no início, no lugar onde geralmente fica a dedicatória, Abílio explica: “O nome ´Recoluta’ tem origem pastoril, platina possivelmente, derivado do verbo ‘recoger’ em espanhol ou ‘recolher’ em português. Significa trazer de volta a rês alçada, perdida nas quiçaças e gravanhas do caminho. Este livro é uma recoluta literária, buscando em livros dos outros, jornais e revistas, coisas que escrevi, restos de mim mesmo, um balaio de saudades”.

Logo na primeira parte, no primeiríssimo texto, Abílio conta um pouco de sua infância na fazenda pantaneira, a mesma em que Manoel de Barros cresceu, o lugar que marcou sua poesia e a imaginação de diversos leitores. Na época em que Abílio morava na fazenda recém-fundada pelos pais, o irmão mais velho já tinha ido estudar na cidade.

Marcada por solidão, a fazenda mexeu com Abílio tanto quanto mexeu com Manoel. Imaginativo, o irmão mais novo do poeta, que se dedicou ao magistério, formou-se em direito e filosofia, é membro da Academia Sul Mato-Grossense de Letras e deu continuidade ao legado do pai nas fazendas pantaneiras, também tem um lado lírico aflorado, embora não se considere escritor propriamente dito, mesmo com seis livros publicados.

Relembrando a solidão da fazenda, Abílio, assim como o irmão, não tem certeza do que é realidade e o que foi forjado pela imaginação infantil. Como exemplo temos o dia em que, sozinho com a mãe, um andarilho entrou nas terras da família Barros. Dona Alice, apavorada, se trancou na pequena casa com o filho. Um tio, ainda adolescente, correu em direção ao intruso para impedir sua aproximação. Sem ter certeza se o diálogo que tem na lembrança realmente aconteceu ou não, Abílio o relata como uma experiência marcante.

“-De onde vem o senhor?
- Venho do mundo, disse o homem.
-Para onde o senhor vai?
- Vou para o mundo.
- Então é naquela porteira, indicou meu tio. E o louco saiu pisando firme, na direção do mundo.”


Lembranças como estas permeiam “Recoluta”, o balaio de saudades de Abílio. Outra memória significativa é sua iniciação no mundo dos livros. Na casa, não tinha nenhum. As primeiras publicações a que Abílio teve acesso foram livros infantis da escola. No ginásio, leu as antologias poéticas obrigatórias. Mas o primeiro livro com “início, meio e fim” foi presente do irmão Manoel de Barros, que já morava no Rio de Janeiro. “Pela primeira vez li um livro. Não me lembro do segundo”, escreveu Abílio.

No entanto, a adolescência do “doutor que não faz jus ao título” não foi marcada por intelectualidade precoce, rodas poéticas ou ativismo juvenil. “Não lia livros”, escreveu. “A adolescência é uma doença e só o tempo cura. Acho que a transpus sem livros. O cinema virou prioridade e o sexo de forma exigente passou a guia dominador. Só quando passei para o curso científico, já no Rio de Janeiro, comparando-me aos colegas, despertei para minha ignorância literária”.

Hoje, Abílio vive em Campo Grande, há algumas quadras de onde vive o irmão poeta. Sua casa, cheia de móveis antigos com ares grandiosos, tem a fachada coberta por uma selva urbana. No escritório, rodeado de livros, Abílio escreve todos seus textos à mão. Foi assim que escreveu seus livros, seus artigos de jornal e todo o resto. “Eu não sei usar a máquina de escrever nem o computador. Eu escrevo a mão e Carolina (sua esposa) passa os textos para o computador”, disse-me em certa ocasião.



Atualmente, aos 85 anos, é um dos únicos membros da família Barros disposto a relembrar o passado e a conversar sobre os feitos do irmão poeta. Muitas pessoas o procuram com este fim e a pergunta é sempre a mesma: “Como ele é?”. Esta questão também está respondida nas páginas de “Recoluta”.

“Confesso que, apesar de irmão, não sei dizer nada dele fora da sua poesia. Sempre foi poeta em tempo integral. Nasceu assim, com esse distúrbio lírico.”

Sobre seu novo livro, Abílio não tem nada a dizer que já não esteja nas 270 páginas de lembranças e opiniões. Só pede que, por gentileza, as perguntas e outros escritos sejam mandados pelo correio, pois o computador é uma máquina que não se tornou sua amiga.
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