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Sexta-feira, 03 de maio de 2024

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Lei Roaunet e Moda: a polêmica da vez

Já que se passaram 2 semanas sem um texto meu (já aproveito para pedir desculpa se alguém sentiu falta), vamos voltar com polêmica, porque todo mundo adora uma boa polêmica. E a boa dessa vez é um assunto que foi publicado pelo Folha de São Paulo em matérias intituladas ( e tendenciosas como esse meu comentário): “Ministra Marta Suplicy libera Lei Rouanet para desfile de grife de luxo na França”, “Comissão não teve "visão" ao rejeitar projeto de estilista para Rouanet, diz Marta” e ainda, “Setores culturais reagem ao uso da lei Rouanet na moda”.

As matérias reivindicam o fato de a Ministra da Cultura, Marta Suplicy, ter passado por cima da decisão tomada através de votação por membros do Cnic (Comissão Nacional de Incentivo a Cultura) e ter aprovado o projeto do estilista Pedro Lourenço que poderá utilizar de recursos (R$ 2,8 milhões) através da Lei Rouanet, lei de fomento a cultura através de isenções tributárias, para apresentar sua coleção que tem como tema a interpretação contemporânea de valores culturais e estéticos de Carmen Miranda. Além disso, os estilistas Ronaldo Fragae Alexandre Herchcovitch também receberão incentivos através da lei Rouanet com R$2,6 e R$2 milhões em incentivo,(esses que não foram votados pela comissão, mas aprovados em caráter de urgência por Marta).



A inclusão do setor da Moda como segmento cultural provoca muitas discussões e envolve principalmente a questão sobre moda ser arte ou não. Moda é uma manifestação que com certeza está impregnada na cultura: ela é um registro do tempo, da história e da nossa sociedade.

Por exemplo, em matéria do Folha de São Paulo a estilista Raquell Guimarães criticou o fato de o projeto de Pedro Lourenço apresentar a ideia de que um desfile de moda é uma exposição de artefatos artísticos, alegando que "A roupa por si só não é arte. Estilista que se intitula artista tem de vender para colecionador e colocar sua roupa no museu". Ela ainda defende que se o designer apresentar ao público um show artístico, o incentivo é justificável, mas se o público sair com vontade de consumir a roupa, então esse é um evento comercial.

O que mais tem causado indignação da classe cultural é o fato de a lei estar beneficiando marcas/empresas e não o setor da moda em si com desfiles que geralmente não são abertos ao público, não oferecem nenhum tipo de capacitação e transmissão de ensinamentos para pessoas do setor, mas servem como vitrine para beneficiar somente a própria marca em termos de publicidade e claro, financeiramente (apesar de que foi alegado que 20% dos convites serão da imprensa, formadores de opinião e patrocinadorese a outra parte será direcionado para o público interessado).



A ministra da cultura, Marta Suplicy, em contrapartida diz que esse incentivo traz benefícios ao “soft power” brasileiro, conceito que propõe fortalecer a imagem do país no exterior através de bens imateriais (moda brasileira sem DNA brasileiro, como no caso da criações de Pedro Lourenço, para gringo ver). Outras reinvindicações também vem pelo fato de o projeto estar beneficiando nomes que já temlugar no mercado da moda, como o caso do estilista Alexandre Herchcovitch o qual pertence a Companhia InBrands (empresa que detém direitos sobre a marca) que “parece” possuir recursos suficientes para investir num desfile.

Mas por outro lado, há também que se cantar uma vitória, já que o setor de moda além de enfrentar o preconceito de ser ou não ser realmente uma expressão cultural (não tenho dúvida nenhuma disso!), com essa aprovação ganha espaço como força criativa e incentivo de políticas públicas.

Paulo Borges, idealizador do São Paulo Fashion Week e CEO da Luminosidade, escreveu um texto ao Portal FFW expressando a sua opinião acerca do assunto, com a experiência de quem trabalha e luta no mercado da moda brasileira há 30 anos, quando o setor ainda era embrionário.

Em parte do texto ele diz algo que resolvi transcrever, pois compartilho da opinião: “O Brasil, infelizmente, ainda é uma sociedade altamente preconceituosa, presa a estereótipos que não valem mais nada, e que não vê o mundo que se transforma ao seu redor. [...] O ponto principal é somar e não dividir. Unir e não separar. Ampliar todas as possibilidades disponíveis e construir novas.”(Leiam o texto aqui: http://ffw.com.br/noticias/moda/paulo-borges-fala-sobre-moda-renuncia-fiscal-e-futuro-e-chama-classe-para-reflexao-e-uniao/).
Isso não significa que acho que devemos nos acomodar com decisões, mas sim lutar e fazer com que as coisas aconteçam de um jeito ou de outro e que por mais controvérsias embutidas nesse beneficiamento de certos nomes/marcas, ainda assim o incentivo ao setor da moda pode ser tachado de alguma conquista. Agora #orar e mexer os pauzinhos para hajam investimentos em regiões descentralizadas (não só em grandes centros como o Sudeste), investimento na própria indústria têxtil nacional (senão a China vai engolir todo mundo!), investimentos em cursos de capacitação e claro, em novos talentos.
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- Aqui a descrição dos 3 projetos publicadas no Diário Oficial:

“Mostra de Moda em São Paulo e Nova York: Herchcovitch fala de Antropofagia Americana”
Resumo do Projeto: “O resultado do processo de pesquisa e criação será apresentado na forma de uma coleção feminina desfilada em duas cidades centrais no calendário da moda nas Américas, São Paulo e Nova York, revisitando o movimento de antropofagia cultural em sentido amplo, criando obras de vestuário contemporâneo na dialética viva entre estranho e o familiar, estrangeiro migrante e o sedimento local, extraindo a experiência conceitual que emerge do passado colonial no contato dos europeus com corpos ameríndios”.

“Moda brasileira em Paris: internacionalização da criatividade, Pedro Lourenço”.
Resumo do Projeto: “A exposição de artefatos e de criações artísticas pretende mostrar duas coleções contemporâneas de moda feitas por um designer brasileiro, pensadas através da ótica do jovem e internacionalmente renomado estilista Pedro Lourenço que interpretará valores culturais e estéticos da performer e cantora Carmem Miranda e que os traduzirá para os dias atuais em duas mostras diferentes desfiladas na semana de moda de Paris”.

“Mostra Artesãos do Brasil na poética da moda: Sedimentos criativos revisitados por Ronaldo Fraga”
Resumo do Projeto: “A exposição de cultura visual contemporânea e de criações de cunho autoral de Ronaldo Fraga apresentará artefatos têxteis e técnicas brasileiras que transitam do popular ao erudito e do erudito ao popular, trabalho que se desdobra em duas coleções desfiladas nas temporadas de moda de São Paulo, evento conhecido como São Paulo Fashion Week. Mário de Andrade, João Cabral de Melo Neto e o artesão Espedito Seleiro são inspirações para estas duas Mostras”.

Ler +: http://ffw.com.br/noticias/moda/desfiles-financiados-pela-lei-rouanet-entenda-a-polemica-e-conheca-as-contrapartidas-das-marcas/

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