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“Os ingredientes de Mato Grosso me colocaram no programa”, diz chef cuiabano do ‘Mestre do Sabor’

da Redação - Isabela Mercuri

No último dia 25 de outubro, o chef cuiabano Marcelo Cotrim apresentou, em rede nacional, um prato preparado com pintado grelhado, glaciado com tucupi preto, mousseline de mandioquinha e pequi, farofa com milho torrado, açúcar e canela (o famoso pixé) e escamas de peixe fritas. Com esta mistura, foi aprovado e passou a ser um participante do ‘Mestres do Sabor’, reality show gastronômico da rede Globo. O peixe, por um erro técnico, ficou cru. No entanto, os ingredientes de sua terra lhe deram a chance de participar do programa. Para Cotrim, isso mostra a importância da culinária mato-grossense, que ele pretende homenagear e mostrar ao público enquanto tiver oportunidade. “Foi o pixé, foi a farinha super crocante, foi a escama de peixe, foi o kanjinjin. Eles garantiram a minha vaga”, comemora.

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Marcelo tem apenas sete anos de experiência profissional na cozinha. Antes disso, estudou publicidade e propaganda e sistemas de informação – mas não atuou em nenhuma das duas áreas – e foi proprietário de um estacionamento e lava jato e de uma agência de turismo. Foi com o incentivo de sua noiva que ele decidiu mudar totalmente de vida e, para isso, se inscreveu no curso de gastronomia da Universidade de Cuiabá.

“A minha noiva falou: ‘Cara, todo final de semana e você quer cozinhar... vai fazer gastronomia”, lembra. Os churrascos de domingo e jantares em família, então, se tornaram algo mais sério. Na mesma época, a noiva deixou a carreira de dentista para se tornar maquiadora, e com os dois empregos notívagos, as rotinas continuaram em harmonia.

Logo no primeiro mês de faculdade, Marcelo se viu tentado a participar de um concurso. “Era para desenvolver um prato de peixe utilizando ingredientes regionais. Mas eu não tinha nem tido aula prática ainda, e a galera do quarto semestre, já formando, ia participar. Então a primeira coisa foi vencer esse medo. Eu venci o medo e decidi me inscrever. Mas para fazer isso, eu tinha que pesquisar os ingredientes regionais”.

Este foi o primeiro contato mais profundo do chef com as diversas opções da gastronomia local. Escolheu um prato muito semelhante ao que apresentou agora no ‘Mestres do Sabor’ – somente o mousseline era de mandioca, e não de mandioquinha – e, para sua surpresa, venceu, com elogios dos jurados e superando os outros concorrentes, que já tinham muito mais experiência.

“Isso deu um gás. Eu terminei o concurso meio dia e meia, duas horas da tarde eu já estava recebendo ligações de restaurantes para eu assumir cozinhas”. O pé no chão não lhe deixou assumir essas responsabilidades, mas já lhe impulsionou a pesquisar e conhecer ainda mais a cultura de Mato Grosso.

Com o prêmio que recebeu, uma bolsa de estudos de 50%, fez uma pós-graduação em gastronomia brasileira, e foi unindo prática e teoria que construiu sua carreira, já que desde o início da faculdade, após o concurso, começou a fazer eventos pela cidade.

Quando se formou, no entanto, já sabia que não queria ter seu próprio restaurante, e se tornou consultor. “Acho que é o pensamento de 95% de quem faz gastronomia, mas hoje me último pensamento é ter um restaurante”, afirma. “Porque eu atendo consultoria e sei o quão difícil é a conta fechar, lidar com mão de obra, fornecedor, imposto... eu sei como é a real”.

O primeiro trabalho como consultor foi assim que se formou, em 2014, no bar do Azeitona. Na época, criou pratos adaptando a cozinha dos turistas que vinham para ver os jogos da Copa em Cuiabá com ingredientes locais. Depois de lá, passou também pelo Duca’s, Sagrado Sal, Bendito, Sebrae, dentre outros, fazendo trabalhos como readequação cardápio, estoque, treinamento de equipe, criação de pratos, desenho de cozinha e contato com fornecedores.

Com o tempo, o chef passou a ficar cada vez mais conhecido, e começaram a surgir os convites para realitys: dois para o MasterChef, um para o The Taste e um para o Top Chef. Para todos, no entanto, ele disse não.

“Porque eu sei o quão difícil foi para eu me manter na gastronomia até hoje, sem estar em um restaurante, sem ter um restaurante, e conseguir atender o público que eu atendo, da forma que eu atendo, cobrando o preço que eu acho justo. É uma trajetória que foi rápida, mas difícil. E se você chega lá e toma um esculacho, você volta pra casa e as pessoas vão pensar: porque vão te contratar?”, explica.

Mestre do Sabor

Foto: Victor Pollak

O convite para o reality show da TV Globo veio de supetão. “Eu estava carregando as coisas do meu projeto com o Big Lar e me ligaram e falaram: ‘Olha, Marcelo, aqui é da Globo, a gente  está com um projeto de gastronomia, e a gente queria que você fizesse parte’”. Como estava ocupado, Marcelo pediu para que retornassem em uma hora, o que eles fizeram.

A produção, então, lhe pediu que fizesse um vídeo para montar um portfólio. Assim que ele enviou, eles afirmaram que em dois dias dariam uma resposta – que veio, na verdade, mais de quinze dias depois, já com um convite para ir até o Rio assinar o contrato, pois ele estava entre os 60 chefs que passaram para a próxima fase. “Eu nem sabia que tinha uma próxima fase”, brinca.

Na Globo, já avisaram que não falariam como chegaram a cada um dos participantes. Marcelo, no entanto, percebeu que o nível era alto. “Tinha gente que tem de profissão o que eu tenho de idade, que trabalhou em diversos hotéis, restaurantes renomados. O nível estava altíssimo”.

Na hora de decidir qual prato faria, ele não pestanejou em optar pelos ingredientes da terra “Quando o pessoal viu o que eu ia fazer, falaram: ‘você vai colocar pequi, é arriscado...’. Mas  eu falei, se eu estou lá, é pelo trabalho que eu faço de cozinha regional. Eu vou ter uma oportunidade de mostrar nossos ingredientes, meu trabalho como é feito, e vou fazer um polvo? Não, não é isso... é o que me colocou lá. Arrisquei mesmo de colocar os elementos que não eram conhecidos, e deu certo”.

Para o chef, esta é uma grande vitrine para a gastronomia de sua terra, que ele vai aproveitar ao máximo. “Já no primeiro programa foi incrível isso. O Claude é incrível, é quem fez acontecer a gastronomia no Brasil, a família dele fez a nouvelle cuisine (...) e eu estava ali, apresentando o prato e ele não conhecia piraputanga. Perguntou se a escama que eu estava usando era de pintado, porque não sabia que pintado é um peixe de couro. Não conhecia o kanjinjin. Então é incrível ele falar: cara, muitas das coisas que você está usando aqui eu nunca vi”.

E o chef não quer ficar somente nisso. Enquanto puder, quer mostrar também que a culinária mato-grossense não é só peixe e para fevereiro, meses depois da final, pensa em organizar uma excursão com os participantes no Pantanal, para uma imersão gastronômica. “É o que eu sempre falo, temos a Ariane, que faz o possível e o impossível para levar a cozinha de Mato Grosso para fora, mas uma pessoa só é muito pouco. Temos vários outros chefs incríveis, e temos que levantar nossa bandeira, levar nossos ingredientes para a galera ver”, finaliza.

Serviço

O Mestre do Sabor é um reality de gastronomia apresentado por Claude Troisgros e Batista. Ele é exibido toda quinta-feira na TV Globo, sexta-feira no GNT e domingo na Globo Portugal. Marcelo já passou para a próxima fase, e estará na próxima quinta-feira, dia 7 de novembro.

Acesse o Instagram do chef Marcelo Cotrim AQUI.
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