Imprimir

Notícias / Literatura

Após FLIP, autor lança coletânea de 'minicontos' no Sesc Arsenal

Da Redação - Isabela Mercuri

Após lançar seu segundo livro de ficção, ‘Algazarra’, na Feira Literária Internacional de Paraty (Flip), e no Patuscada - bar, café e livraria da Patuá na capital paulista – o escritor Santiago Santos traz ‘Algazarra’ a Cuiabá nesta quarta-feira (29). A apresentação da obra acontece na choperia do Sesc Arsenal, a partir das 19h.

Leia também:
Inspirado por mochilão, escritor de Cuiabá comenta 1º livro sobre civilização Inca e dá dicas para começar a escrever
 
‘Algazarra’ é uma coletânea de minicontos, drops literários ou ‘flash fictions’. O autor define: “Flash Fiction nada mais é que o termo inglês que designa o miniconto, uma narrativa que se desdobra entre 300 e 1.000 palavras, com começo, meio e fim”.
 
Santiago utiliza o termo desde quando criou um projeto e começou a postar, no Facebook, seus minicontos. Com o tempo, eles migraram para o SITE. “O barato desse formato breve é justamente essa mistureba, a possibilidade de atirar pra qualquer lado que venha à cabeça. Uma semana é uma história policial, na outra fantástica, na outra um faroeste, na outra realista contemporânea, na outra uma ficção histórica, na outra uma falsa corrente de e-mail. As possibilidades são infinitas”, completa.
 
No início de 2018, este projeto completou cinco anos, com mais de 420 textos publicados, sendo que muitos foram republicados em diversas revistas, jornais, blogs, sites e zines do país. ‘Algazarra’ é a primeira coletânea que deriva do projeto. São 50 drops, escolhidos ‘a dedo’. Todos foram revistos, reordenados e acrescidos de um ensaio sobre a história do Flash Fiction e os bastidores de produção. A obra foi publicada pela editora Patuá, de São Paulo.
 
Em 2016, Santiago publicou seu primeiro livro, ‘Na eternidade sempre é domingo’, um compilado de contos que dialogam entre si para criar uma única história, todos baseados na viagem que o autor fez pela América do Sul em 2014. A obra foi financiada pelo edital de incentivo à cultura da Prefeitura de Cuiabá. Além de escritor, ele é tradutor do inglês, preparador de originais e jornalista. Nas horas cheias, também atua como gerente financeiro.
 
Leia um dos ‘drops’:
 

#170 - Náufraga

Achei o rádio na praia no 107º dia. Abri a tampa e vi duas pilhas enferrujadas, esverdeadas, derretidas. Mesmo assim ligou.

— zzzzzssara. Aqui quem fala é a Jussara. Na escuta?

E assim seguia, repetindo a gravação. Testei outras frequências, mas só aquela funcionava. Levei pra barraca. Fiz a fogueira, esquentei as mãos, tentei dormir e nada. A fome era tamanha que peguei um coco da mochila, quebrei e comi a massa branca pela milésima vez, imaginando um pedaço de costela molinha encaixada nos dentes, vinagrete e feijão tropeiro pra acompanhar. Capotei. Sonhei que um navio avistou minha inscrição feita com barro seco no paredão e um helicóptero apareceu, recheado de saquinhos pardos com Big Macs dentro.

Quando acordei, Jussara ainda tentava entrar em contato. Devia haver uma torre de transmissão por perto pro sinal me alcançar. Ainda não tinha me embrenhado fundo na mata pois achava que a salvação viria da água. Mas se havia uma pessoa viva na ilha eu precisava encontrá-la. Subi a encosta, tentando identificar algo na imensidão desnivelada daquele amontoado de rocha, terra e folhas. Escolhi o ponto mais alto e parti. Cheguei perto do anoitecer. Rodeei algumas árvores e descobri uma cabana, uma antena saindo pelo teto.

Jussara me esperava ali. Atrás dela, outra Jussara. No jardim, regando as verduras, outras Jussaras, e outras mais descascando batatas, limpando peixes, escrevendo numa mesa, cantando, todas variando apenas no comprimento do cabelo e no encardido das roupas.

— Bem-vinda, Jussara — ela disse.

— O que é isso?

— Somos você, você é nós. O tempo aqui é confuso.

— Como assim?

— Há algum distúrbio na regulagem temporal da ilha. Pela nossa contagem, a primeira achou o rádio no 189º dia. Você achou no 107º, certo? A cada nova Jussara diminuímos um dia. Nossa esperança é que daqui a 107 de nós retornaremos ao momento do naufrágio. Até lá construiremos uma embarcação resistente o suficiente pra alcançar o navio e virar o leme antes do choque com as rochas.

— Meu Deus.

— Aqui, toma essa vara. A primeira coisa que nos ensinamos é a pescar. A Jussara 154 vai com você. Boa sorte.


Serviço
 
Lançamento do livro Algazarra, de Santiago Santos
Dia 29 de agosto, a partir das 19hs
Choperia do Sesc Arsenal [estacionamento gratuito]
Rua 13 de Junho, S/N - Centro Sul
Valor do livro: R$ 40,00 [dinheiro, débito e crédito]
Imprimir