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Notícias / Comportamento

Há dez anos, psicóloga se dedica a tratar pacientes com câncer por meio da arte

Da Redação - Isabela Mercuri

Já são dez anos convivendo com pessoas que lutam, todos os dias, para sobreviver. Dez anos fazendo com que este, no entanto, não seja o único pensamento em suas mentes, conversando sobre a vida e a morte e – porque não – ensinando um novo ofício a quem terá que recomeçar a vida. Maria de Fátima Pedreira, psicóloga, lidera o setor de ‘Arte Terapia’ do Hospital de Câncer, e guarda em sua memória histórias que leva para sempre.

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“Eu comecei aqui há dez anos, porque eu trabalhava, antes, no Adauto Botelho, e tinha uma paciente lá que a mãe dela ficou internada no Hospital de Câncer, e percebeu que aqui não tinha nada para os adultos, só para as crianças”, lembra Fátima. Na época, os pacientes que vinham do interior, ou os que precisavam passar o dia todo na instituição para fazer diversos tratamentos, ficavam deitados ou sentados durante horas, amargando os pensamentos negativos trazidos pela doença. “Ela falou com o diretor, na época era o Dr. Rogério, e ele aceitou que eu viesse fazer este trabalho aqui. Só que ele me chamou e disse: ‘nós não vamos dar nada pra você, você vai ter que começar a pedir”.

Foi assim que se iniciou o trabalho da sul-matogrossense, que vive em Cuiabá já há trinta anos. No início, o máximo que ela tinha para oferecer eram papeis e lápis de cor, para que eles pintassem cartões de nata. Foram tantos, que o setor já conseguiu vendê-los para comprar mais materiais. Só um ano depois, que uma senhora, chamada Dona Iolanda, doou a primeira máquina de costura, e assim continuou o trabalho de Fátima: com doações, vendas e muito esforço.

Atualmente, o setor de arte terapia do Hospital de Câncer conta com dez voluntários, muitos deles ex-pacientes que se curaram e decidiram ajudar. “É muito boa essa interação, essa amizade que eles têm aqui. Porque quando um paciente descobre que tem câncer, a única coisa que ele consegue ver é a morte. E conversar com pessoas que já passaram por isso e estão curadas, faz eles terem mais esperança”, afirma.

O ateliê fica aberto diariamente, durante oito horas, tempo em que Fátima trabalha. Ali são confeccionados panos de prato, bonecos, quadros e outros tipos de artesanato, que são vendidos para ajudar a instituição. “Como o hospital tem muitas dívidas, não é sempre que esse dinheiro volta pra gente pra poder comprar mais material. A maioria do que nós temos vem de doações mesmo”. Apesar dessa dificuldade, os pacientes que produzem recebem uma porcentagem das vendas.

Nos dez anos dentro do Hospital, muitas histórias marcaram a psicóloga. Uma delas, no entanto, foi especial. “Tinha uma senhora, muito bonita, que queria fazer cirurgia plástica e estava fazendo os exames preventivos. Nesses exames ela descobriu que tinha câncer no colo do útero”, lembra. “Ela foi abandonada pelo marido, e a família tinha certeza que ela ia morrer. Não podiam vê-la que já começavam a chorar. Ela decidiu vir para Cuiabá sozinha para se tratar, conheceu o setor de arte terapia e adorou. Ela passava o dia inteiro aqui. Tomava café da manhã, almoçava... E quando acabou o tratamento, depois de seis meses, curada, ela não queria mais ir embora. Tivemos que fazer todo um trabalho, porque ela tinha sido abandonada pela família, mas precisava reencontrá-los”, conta.

Além dela, existem muitos outros ex-pacientes que usam o que aprendem na arte terapia para seguir a vida. Um deles, conhecido como ‘Seu Guimarães’, começou com desenhos, e atualmente expõe seus quadros junto ao artista plástico Nilson Pimenta, com quem fez outras aulas. Outras, principalmente mulheres, escolhem o artesanato como nova fonte de renda. “Tem muita costureira, cozinheira, que descobre que tem câncer e vem pra cá, e fica por um tempo recebendo o auxílio-doença. Depois, quando elas ficam curadas e descobrem que não vão mais receber, muitas não podem voltar a trabalhar com o que faziam antes, e usam o artesanato como nova fonte de renda, para se sustentar”.

Para alem dos benefícios financeiros, a arte terapia, segundo Fátima, ajuda de forma prática no tratamento da doença. “Existem várias terapias que podem ser feitas, com dança, teatro, mas o que fazemos aqui é essa de artesanato. E isso muda a qualidade de vida da pessoa mesmo, porque quando ela produz alguma coisa, ela passa a se sentir útil, a ter um estímulo a mais para viver. Além de tudo isso tem a amizade entre elas, e as conversas que acontecem aqui, que são muito importantes”, finaliza.

Serviço

O setor de Arte Terapia do Hospital de Câncer sempre precisa de doações, principalmente de: enchimento de acrílico para boneca, linha para crochê ou tapete, e qualquer outro material que pode ser reciclado.

Também é possível ser um voluntário, por até 4 horas semanais. Para mais informações: (65) 3648-7560.
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