O caso do empresário e influenciador automobilístico Ricardo Godoi, de 46 anos, que morreu na segunda-feira (20) após se submeter a uma anestesia geral para “fechar as costas” com uma tatuagem em Itapema (SC), ganhou repercussão nacional, chamando atenção para a prática. A anestesista Rafaela Coutinho e o tatuador Kevin Martins explicaram alguns dos riscos que envolvem a sedação para grandes tatuagens, algo que tem se tornado uma tendência entre artistas e influenciadores.
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Olhar Conceito, Rafaela aponta que, apesar do uso de anestesia geral para grandes tatuagens não ser algo novo, tem aumentado nos últimos anos. A anestesista não se posiciona contra a prática, desde que ela seja realizada por um anestesiologista e siga todas as normas de segurança.
“Não sou contra, porque é um procedimento doloroso e geralmente demoro, quando fecha as costas, por exemplo. Já tivemos casos de pessoas que morreram por intoxicação em estúdio de tatuagem quando se usa apenas anestésico local pelos tatuadores. A sedação é um tipo de anestesia que tem risco igual a qualquer anestesia e qualquer procedimento”.
Entre os principais perigos da anestesia geral estão reações adversas aos medicamentos, como alergias graves ou efeitos colaterais como náuseas e tonturas, além de possíveis complicações respiratórias e cardiovasculares, incluindo arritmias ou alterações na pressão arterial.
Para Rafaela, o ato de se tatuar pode ser comparado a um procedimento estético como uma cirurgia plástica, sendo uma escolha do paciente optar por ser sedado para realizar a tatuagem. Ela ressalta que é necessário que a anestesia geral seja realizada “com a maior segurança possível” e com todos os riscos “muito bem informados”.
“Então, o paciente bem informado, eles têm o direito de escolher fazer o procedimento sem sentir dor, se tudo ok, pode realizar sim. Nós temos normas de solicitação de exames pré-anestésicos para tentar diminuir esse risco, e mesmo o fato de ter exames, risco cardiológico para dar um direcionamento sobre a saúde do paciente não significa que ele não está sujeito a ter alguma complicação como aconteceu nesse caso”.
A anestesista reforça que os casos precisam ser individualizados para saber se há necessidade de exames cardiológicos, por exemplo. “Não dá pra colocar todos em um pacote só. Não sei qual o caso desse paciente [de Santa Catarina] especificamente, não sei se foi infarto, anafilaxia ou outro evento que pode abrir o quadro com uma parada".
Tatuagem feita por Kevin Martins em seis sessões, tatuador estima que processo de tatuar levou 20 horas. (Foto: Kevin Martins)
Procedimento desnecessário e arriscado
Já o tatuador Kevin Martins é contra o uso de anestesia geral no mundo da tatuagem e o aumento da tendência da sedação entre artistas que fizeram grandes tatuagens é um reflexo do imediatismo na sociedade atual.
“Você dedicar 30 horas em uma costas em 10 sessões, é totalmente diferente de dedicar 2 horas em uma sessão, não tem como comparar uma coisa com a outra. Isso começou pelo Neymar, Mc Kevin, depois começou a ir para esses centros estéticos. Isso cresceu porque, obviamente, é um mercado, se você tiver um bom marketing você consegue enganar as pessoas”.
“Vejo que o que tem instigado esse consumo é realmente esse imediatismo, não só na tatto, mas em tudo que a gente consome. A gente quer ficar com o corpo lindo rápido, com a barba grande rápido, ter a melhor casa rápido, de forma que a pessoa paga o quanto for necessário, mas tem coisas que não são sobre isso”, continua.
No Brasil, diversos famosos optaram por utilizar anestesia geral ou sedação para realizar grandes tatuagens, buscando minimizar a dor durante o procedimento. O cantor MC Cabelinho submeteu-se à anestesia geral para tatuar as costas, permanecendo entubado por cerca de oito horas.
MC Daniel também recorreu à anestesia geral para cobrir suas costas com imagens de personagens de desenhos animados, em uma sessão que durou aproximadamente sete horas. A influenciadora Rafaella Santos, irmã de Neymar, utilizou sedação para cobrir uma tatuagem antiga nas costas com a figura de um leão e duas borboletas”.
Kevin chama atenção para a dor sentida pelos pacientes que são sedados para grandes tatuagens após o fim da anestesia geral. “Imagina como é a dor, é óbvio que essa galera toma remédio e tal, mas imagina quando acaba a anestesia e volta a dor? Você está com um ferimento na suas costas inteiras, imagina a recuperação?”.
Com os clientes, o tatuador opta por dividir tatuagens grandes em mais de uma sessão e reforça que, durante o processo de tatuar, o profissional também precisa respeitar o momento de pausa para garantir a qualidade do trabalho.
“É muito importante ser dividido em mais sessões, porque existem duas pessoas no processo da tattoo, o tatuador também vai cansar, principalmente em uma peça grande, ele vai cansar bastante, a pessoa também não vai aguentar muito tempo, vai aguentar de 8h a 10h, as pessoas que aguentam muito e mesmo assim você vai chegar num limite”.
Além disso, Kevin ressalta que o tempo entre as sessões é importante para que os tatuadores consigam identificar possíveis retoques e o avanço da cicatrização.
“Gosto sempre de dar esse tempo, principalmente quando são trabalhos maiores, porque você consegue perceber como aquilo cicatriza, consegue dar um toque em algo que precisa, dar um ajuste tonal em alguma parte, que muitas vezes na hora ou no dia da sessão, você não vai conseguir colocar a mais”.