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Quinta-feira, 18 de abril de 2024

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DO INSTITUTO CIRANDA

Mato-grossense vence prêmio na USP com performance de clarinete

Foto: Reprodução / Instituto Ciranda

Jéssica Gubert Silva

Jéssica Gubert Silva

A mato-grossense Jéssica Gubert Silva, hoje com 28 anos, mal podia imaginar, durante a infância em Rondonópolis (219km de Cuiabá), que chegaria tão longe. No último dia 18 de outubro, venceu a categoria ‘Música Erudita’ no Programa Sol Nascente, da Universidade de São Paulo (USP) - onde é aluna de mestrado - tocando ‘Fantasia para Clarinete Solo’ de Jorg Widmann. Ela, que já fez canto e piano, mas se encantou com o clarinete, foi aluna do Instituto Ciranda e, hoje, sonha em terminar o mestrado e o doutorado para trazer o conhecimento ao estado natal.

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O Programa Sol Nascente é uma premiação tradicional da USP, que já acontece há 29 anos. Em 2019, 694 estudantes de graduação e pós-graduação da Universidade submeteram 590 trabalhos nas categorias de Artes Cênicas, Artes Visuais, Audiovisual, Design, Música Erudita, Música Popular e Texto. Foram escolhidos oito finalistas de cada categoria e, no dia da final, cada vencedor foi contemplado com a gratificação de R$4 mil. A rondonopolitana foi uma das vencedoras.
 
A história de Jessica com a música começou quando ela ainda tinha cerca de três anos de idade, fazendo aulas de canto em um grupo. “Foi um processo de musicalização pra mim. Quando eu tinha uns seis anos, meus pais me matricularam para fazer aula de piano, até os 13. Mas confesso que não deu muito certo, e dei bastante trabalho para as minhas professoras. Não sei se é por causa da metodologia, por ser um instrumento que você estuda sozinho, mas eu não me encontrei com o piano e nem o canto, era mais uma brincadeira”, contou ao Olhar Conceito.

Foi aos 14, incentivada pelo pai, que ela decidiu procurar outro instrumento. “Eu bati o olho na banda e vi o clarinete, aquele instrumento preto, meio esquisito...”, lembra. “O saxofone eu olhei e achei muito difícil, o trompete e o trombone pra mim era meio masculino - na minha mentalidade da época - mas no clarinete e bati o olho, nem escutei o som e já falei: quero aquele instrumento”.

A primeira aula foi em 2005, e, desde então, ela dedica várias horas aos estudos, todos os dias. “Me apaixonei pelo instrumento. Depois de três meses fiz minha primeira apresentação, fiz um solo na época, foi muito legal... E com oito meses de instrumento eu falei: quero fazer isso da minha vida. No primeiro ano foi tudo muita novidade, muito intenso, e eu percebo que esse amor vem até hoje”.

Desde o início, em Rondonópolis, seu professor era Murilo Alves, o maestro do Instituto Ciranda. Na época, o grupo ainda não tinha polos, e o professor ia para a cidade interiorana a cada quinze dias ministrar as aulas. Alguns anos depois, Jessica mudou-se com a família para Cuiabá, e passou efetivamente fazer parte do Instituto. “Foi um novo universo. A questão da orquestra, conhecer outros instrumentos, as coisas que e aprendi no coletivo, do respeito ao próximo, a questão das diferenças... todo mundo ali na Orquestra convivendo junto, foi um grande crescimento para mim”.

De aluna, ela passou a ser professora, depois monitora, coordenadora de sopro, coordenadora pedagógica e, atualmente, está à frente da direção de desenvolvimento institucional. Durante este tempo, também se dedicou aos estudos: formou-se em licenciatura em música pela UFMT, iniciou o curso de bacharelado em clarinete, e passou a procurar novos horizontes fora de Cuiabá.

“Depois de três anos estudando clarinete com o professor Murilo ele me disse: Jessica, te ensinei tudo o que eu sei. Agora você precisa ir para os festivais, acessar outros professores, saber o que as pessoas estão fazendo nos grandes centros”. Com este incentivo, ela passou a pesquisar e conheceu Luis Afonso Montanha (que foi, por 30 anos, clarinetista do Teatro Municipal de São Paulo).

Jessica passou a fazer vários cursos de férias com ele, até que decidiu ir para São Paulo, em 2017. O plano inicial era ficar por seis meses, mas logo abriu o processo seletivo para o mestrado em ‘Performance em Clarinete’, e ela passou por todas as seis fases. As aulas começaram em março de 2019. Logo depois, ela recebeu um email com as informações sobre o ‘Sol Nascente’.

“Eu mandei o vídeo, eles recebem vários e classificam oito pessoas para a final. Eu fui classificada, fiquei muito contente e comecei a estudar”, conta. A peça escolhida por Jessica foi a mesma que ela tocou no Concurso de Jovens Solistas de Mato Grosso, em 2017 (em que também foi campeã), mas o professor Montanha lhe desafiou a fazer algo diferente. “[Ele] disse: Jessica, tocar clarinete é muito pouco... há dois anos você já ganhou tocando essa peça. Dessa vez, tente fazer algo diferente. Vá além de tocar clarinete, faça arte!”.

A solução para a musicista foi fazer uma performance com seu corpo, por meio de uma coreografia. “Foi uma experiência totalmente inovadora pra mim, algo que me tirou muito da zona de conforto”, declara. “Tanto que eu toquei outras coisas depois, e já vi que minha relação com o palco estava diferente, porque eu me desafiei no palco, tentei ao máximo criar novas coisas e gostei muito da experiência”.



Para a artista, a apresentação veio ao encontro de sua pesquisa no mestrado - em que ela tenta entender como o estudo da música contemporânea, através de técnicas estendidas, pode auxiliar a dominar o instrumento de uma maneira mais versátil.  “Na música contemporânea existem vários tipos de sonoridade, e se a gente dominar esses tipos de sonoridade, na hora de tomar um Mozart, vai ser algo tranquilo também”, explica. “Acredito que o Nascente foi um momento muito importante na minha vida, porque justamente isso, no mestrado eu tenho essa reflexão na questão da música contemporânea: porque estamos fazendo música hoje, no século XXI? O que a gente tem feito? Como a gente se relaciona com o público? Eu tenho refletivo muito sobre tudo isso, tenho lido tudo, pesquisado, e consegui com o Nascente me desafiar e tentar colocar todas essas coisas que eu tenho estudado e refletido no palco”.

Para o futuro, Jessica pretende terminar o mestrado, logo ingressar no doutorado, e, depois, voltar para Mato Grosso para trazer de volta todo o conhecimento. “Eu acredito que a música surgiu na minha vida para me tornar um ser humano melhor. Se não fosse a música, eu não sei quem eu seria, porque as vivências que a música me traz, através da arte, através do estudo do instrumento, é algo muito especial e tem me tornado o ser humano que eu sou”, afirma. “[E] Meu grande sonho é que o máximo de crianças possíveis em Mato Grosso tenha a oportunidade, assim como eu tive, de estudar música. Eu sei a transformação que isso fez na minha vida, e eu sei o que isso faz na minha vida até hoje”, finaliza.

Instituto Ciranda

Há 16 anos ininterruptos, o Instituto Ciranda desenvolve um programa de educação musical dedicado a crianças e adolescentes em idade escolar. Em 2019, serão mais de mil jovens atendidos em nove polos de ensino distribuídos pelo Estado. São eles: Cuiabá (bairros Boa Esperança e Dr. Fábio), Poconé, Várzea Grande (Bairro São Matheus), Rondonópolis e Chapada dos Guimarães, além dos polos de João Carro e Água Fria, zona rural de Chapada.

Parte das primeiras gerações de instrumentistas formada pelo Instituto Ciranda, hoje, ensina para novas gerações de músicos, teoria e técnicas, leitura de partituras e prática em conjunto. “Desde sua criação, em 2003, a instituição vem transformando vidas ao tempo em que forma novas plateias, novos instrumentistas, professores e cidadãos”, comemora o maestro Murilo Alves, presidente do Instituto. O Instituto Ciranda - Música e Cidadania é um dos 32 Pontos de Cultura apoiados pelo Governo de Mato Grosso via Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer.
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