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“Sou mais conhecida que nota de dois reais”, diz comerciante há mais de 40 anos no Santa Helena

Da Redação - Isabela Mercuri

Quando Raquel Alves Borges, hoje com 76 anos, chegou ao bairro Santa Helena, em 1962, não tinha ‘praticamente nada’. A rua não era asfaltada, não tinha luz, não tinha água encanada. Não tinha padaria e nem mercado. E muito menos o hospital. Na realidade, não tinha nem o bairro – que pertencia ao ‘Quilombo’, e só passou a se chamar ‘Santa Helena’ depois que o hospital chegou. Ela viu tudo mudar, e se transformou junto. Hoje, 57 anos depois da mudança, ela permanece por ali, mas está viúva, os seis filhos já cresceram e muitos foram morar longe. Só uma coisa permanece há mais de 40 anos: o seu comércio.



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“Eu aqui sou mais conhecida que nota de dois reais”, contou a Dona ao Olhar Conceito, em uma visita feita num final de tarde de terça-feira. Sentada em uma cadeira de plástico na frente de seu bar, Dona Raquel conversava com os netos, Roberson Borges e Pedro Leonardo Borges, e esperava o tempo passar.

O bar foi criado nos anos 80, mas antes disso ela já comandava, no mesmo lugar, uma mercearia. Raquel era casada com Edmundo Borges, que trabalhava como funcionário público. Os dois se conheceram no colégio Liceu Cuiabano, se casaram e tiveram seis filhos.

“Meu marido era funcionário público. Mas com seis filhos... quem ganha pouco, como que faz? Eu fazia salgado e vendia. [Vendia] cereais, verdura, toda coisa. Até marmitex eu fazia”, lembrou. Foi após algum tempo de cardápio livre de álcool que o marido concordou em começar a vender bebidas, “Porque os funcionários - de lá onde ele trabalhava - vinham todos pra cá tomar cerveja, ficavam aqui”, justifica.



O ‘bar da Dona Raquel’ ficou conhecidíssimo no bairro. Todos os dias, os moradores passavam por ali nem que fosse para comer um pastel. Mas o tempo foi passando, os filhos – três homens e três mulheres – cresceram, alguns se casaram e lhe deram netos e bisnetos. E a cuiabana adoeceu.

Com artrose nos dois joelhos, ela conta que foi ‘enganada’ por vários médicos, que lhe trataram só com remédio, até que um deles deu o veredito: era preciso operar. Durante a recuperação, uma das filhas assumiu o bar, já que o marido, Edmundo, já tinha falecido.

“Quando ele estava doente, ele ainda me cuidava. Ele morreu do coração. De uma hora pra outra ele caiu. Estava atendendo, conversando com todo mundo”, lamenta. Quando faleceu, Edmundo já estava aposentado, e ajudava Raquel com o comércio.
Depois da cirurgia – e depois que Edmundo se foi – Dona Raquel voltou às atividades. Diariamente, às 7h da manhã, abre seu bar, com alguns salgados e as bebidas à venda. Aos sábados, quando tem mais movimento, tem também mais opções.

O horário de fechar, ela afirma que não importa. “Às vezes tem fregueses, a gente fica até mais tarde, dia que não tem fecha mais cedo... é uma coisa que eu que mando, a hora que eu quero. A hora que eu não quero mais estar ali, não estou. Eu não trabalho pra ninguém, trabalho pra mim mesma”.

Apesar de tudo, o famoso ‘bar’ ainda é o que a alegra diariamente. “Eu não tinha como ficar sem qualquer coisa que me alegra, que me diverte. Não tinha jeito de eu ficar sem fazer nada. (...) [Gosto dos] Meus amigos, de conversar, me distrair, ouvir música... isso que eu gosto. É pra preencher meu vazio e também a necessidade, porque hoje em dia não tem quem não precise”, finaliza.

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